Thursday, July 19, 2007

Adaptação das condições de Avaliação dos alunos disléxicos


Prof.ª Doutora HELENA SERRA FERNANDES
Psicopedagogia Especial

Adaptação das Condições de Avaliação dos alunos disléxicos
Exames de 2006-07

São múltiplas as razões que nos levam a afirmar que o Ministério da Educação ao exigir que, para ser concedido aos alunos disléxicos o direito a Avaliação Adaptada, o processo de requerimento dessa adaptação tivesse sido iniciado no 2.º ciclo do ensino básico, está a ignorar a realidade das escolas e a prejudicar “n” alunos, menosprezando os seus direitos.

Estes alunos têm efectivamente necessidades educativas específicas e se não são em devido tempo identificados e não beneficiam de intervenção diferenciada, a falha é da própria escola porque não possui meios para o fazer. No sistema, os que resistem, tornam-se uns “sobreviventes”: sendo muitas vezes indevidamente interpretados, incompreendidos, não apoiados, desmerecidos, às vezes “negativamente marcados” pelos contextos educativos, julgados de atrasados, “amachucados” na sua auto-imagem. No entanto são cidadãos de pleno direito. A escola deve-lhe o “cuidado” com a sua diferença (compreender/saber avaliar e intervir para diminuir a sua dificuldade, descobrir/acolher a sua criatividade, respeitá-lo).

Em nosso entender, o facto de alguns alunos só terem iniciado no 3.º ciclo ou no ensino secundário o processo que lhe permitiu beneficiar de condições especiais de avaliação, só pode ser imputado à falta de condições que se verificam na Escola (falta de conhecimento sobre a problemática, falta de meios para atempadamente se fazer a sinalização-identificação-avaliação e intervenção específica), não devendo os alunos disléxicos em geral, ser penalizados, como foi determinado.

Razões em fundamentamos a nossa opinião:

1- Em geral os alunos disléxicos, apresentam distúrbios na lateralização o que reflecte um funcionamento neurológico atípico, com o qual se relaciona uma significativa diminuição de competências em algumas áreas que constituem pré-requisito da leitura-escrita (ex: a linguagem, em termos de compreensão e/ou expressão; e/ou a psicomotricidade – a interiorização do esquema corporal, o reconhecimento lateral, a orientação espacio-temporal; e/ou a percepção e memória auditiva e/ou visual, a consciência fonológica e/ou rítmica, a motricidade ampla e/ou fina) (problemas que divergem de caso para caso).

2- Essas áreas instrumentais que se apresentarem fracas perturbam a capacidade leitora, atingindo estes alunos performances muito inferiores ao que seria de esperar, face à sua capacidade intelectual e ao esforço que dispendem, podendo:
. necessitar de ler duas e mais vezes os textos, quer quando fazem leitura silenciosa, quer oral, para conseguir colher a informação neles contida, o que implica necessidade de mais tempo para efectuarem as tarefas propostas;
. tornar-se incapazes de assumir ler em voz alta perante alguém, dadas as hesitações/alterações, a arritmia, a falta de expressão;
. ficar, ao ler em voz alta, tão preocupados com a decifração/descodificação que são incapazes de atender, simultaneamente, ao significado das palavras e frases, portanto ao sentido implícito nos textos;

3- Trata-se, em geral, de alunos muito esforçados e aplicados, que em muitos casos investem muito tempo no estudo, sem restar espaço para o lazer (só não acontece quando a auto-estima e baixas expectativas atingiram níveis muito inferiores, preferindo a desistência e abandono); são alunos sem tempo para brincadeiras, jogos, desportos ou outras actividades extra-curriculares.

4- Devido a tão grandes esforços e também porque, em geral, revelam elevada criatividade em algum ou alguns domínios, podem atingir, em algumas disciplinas, resultados escolares de nível satisfatório ou bom;

5- Apesar das dificuldades dos alunos em leitura (na descodificação e na compreensão ou só numa delas) e também, em geral, na expressão escrita (alterações no plano ortográfico e/ou morfo-sintáctico e semântico) os encarregados de educação sentem que o aluno tem “problemas” que não sabem explicar, mas, por desconhecimento, não sabendo que se trata de D.E.A. (dislexia/disortografia e/ou disgrafia e/ou discalculia), não recorrem atempadamente a serviços especializados para avaliação compreensiva e tratamento;

6- São encarregados de educação que, por sentirem que o aluno tem “algo que não controla” que o impede de alcançar melhores resultados, o passam a apoiar no estudo em geral e na preparação para os testes, devendo-se grande parte do produto final obtido, ao acompanhamento e esforço de outrem.

7- A Escola, na grande maioria das situações, tem desconhecido este tipo de manifestações, referenciando os alunos como “desmotivados”, distraídos”, etc.;

8- Muitas vezes, é já no ensino secundário (onde as dificuldades se tornam mais gravosas face às exigências colocadas) que, tanto os encarregados de educação como os professores, assumem “lutar” por uma avaliação-diagnóstico, esforçando-se por obter uma explicação para tais dificuldades e a orientação que lhes permita ajudar o filho ou aluno;

9- Actualmente, já “n” alunos beneficiam, na escola básica, de adaptação das condições de avaliação (porque nos últimos anos se tem vindo a conseguir alertar para esta problemática muitas escolas e professores);

10- Mas há ainda hoje muitas escolas que, não tendo profissionais preparados para fazer a valiação-diagnóstico destes alunos, não lhes prestam qualquer envolvimento diferenciado, ignorando as adaptações a ser feitas, as respostas a implementar.

11- É o próprio sistema educativo que lhe permite transitar de ano com várias negativas (no caso dos alunos disléxicos em geral são as línguas), não havendo necessidade de dar início a um “processo formal” para se preverem as adaptações a fazer no seu caso.

12- Aliás, o facto de o 319/91 se destinar, quase no todo do seu articulado, a prever medidas a aplicar a “alunos com deficiência”, tornou-o como que “proibitivo” ou pelo menos instrumento “non grato” para o caso destes alunos, pelas conotações que a escola (os docentes e os outros discentes) farão em casos de em que se aplica. Isto é, muitos alunos e famílias não quiseram invocar e recorrer a tal legislação para que não ficasse “o rótulo” que arrasta consigo, em sede de senso comum (aliás muitos alunos não querem sequer ir a uma consulta de “psicólogo”, pelas ilações que os colegas fazem a partir daí).

13- Por outro lado, na disciplina de português, no ensino básico, o nível de exigência é muito menor que no ensino secundário, tornando-se o atraso na leitura-escrita, muito mais evidente neste nível.

Por tudo isto consideramos que se revelam gravemente injustas estas medidas que vêm retirar direitos aos alunos disléxicos.

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